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Carl

Publicado: fevereiro 10, 2013 por slyfer052 em Contos
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A primavera chegava, mas não de repente, todos já a previam. Sentiam o ar mudar, e as folhas já não caíam com tanta freqüência. Os insetos também comentavam; “Vai mudar o tempo”.

E realmente, os tempos mudavam.

Os tempos, mas não tudo.

Algumas coisas sempre aconteciam por ali.

– Caaaaaarrll! – exclamou o macieiro, mesmo Carl estando do seu lado.

Aquele grito ecoou por quase todo o parque, mas apesar de tudo e de todos os porêns que se pode existir e subexistir no mundo, Carl era extremamente calmo. O salgueiro mais calmo e pacífico que alguém poderia conhecer.

– O que foi Marshall? Porque está gritando logo cedo? – Perguntou serenamente.

– Foi a Kennelly!… – falava aos prantos – Ela me traiu… Com o Miguel, o carvalho do parque! – sua voz mau saia, e engasgava de tanta seiva que lacrimejou.

Kennelly, era uma samambaia no qual Carl já o advertira a se afastar. Mas não pense que Carl seja uma árvore goradora de namoros ou algo assim, isso quem fazia era a Jucelma a cerejeira do parque. Uma cerejeira idosa e desleixada que fofocava de tudo e de todos. Só que isso é história pra outro dia. O fato é que a maldita samambaia já havia uma má fama pela bosquinhança. E Carl que era sabido de tudo, foi logo alertando o jovem macieiro… “A Samambaia é uma vadia”. Carl lembrou desse dia naquele instante, era começo de outono e a paisagem começava a murchar num desapego belo e desbotado, depois lembrou de seu conselho: “Nunca se apaixone por uma puta” e de tudo mais. Pensou no quanto tinha razão, sempre tem razão é impressionante.

– Viram ela *hiphip* – A choradeira se tornara soluço – Se enraizando com ele ontem a noite!!! – E por fim desabou – BUAAAAAAAAAAAA

Carl olhou aquela cena ridícula e desnecessária, observou os insetos subindo em suas raízes, os ninhos que às vezes coçavam em seus galhos, e por fim o jovem Marshall. Bufou. Resmungou em pensamento. Desejou do fundo de seu coração poder se mexer agora e dar um tapa no macieiro, mas não podia. Bufou novamente.

– Pois é… Ela é uma cara de pau mesmo, esquece ela. – respondeu olhando o horizonte, o sol subia num esplendido amarelo… Uma brisa suave vinha pelo leste.

Brisa esta que fazia Carl lembrar de sua tenra infância. Quando ainda era um pequeno salgueirinho com esperanças e sonhos, cerca de muitos anos atrás… Porém, a vida veio com desdém, e lhe proporcionou apenas a verdade. Uma dura verdade, dura como madeira.

Os choros continuavam.

A brisa soprou novamente, dessa vez… Fez Carl refletir tudo o que havia passado, e no que era. Apesar de não poder se mexer, podia respirar, coisa que muitas outras coisas não podiam. Como um meteoro, por exemplo. Podia se fotossíntesear, que era muito prático também.

Então lembrou que ajudava e abrigava carinhosamente todas as formigas, insetos, passarinhos e demônios dentro de si. Além de ajudar as árvores necessitadas e desamparadas… Olhou mais uma vez para Marshall.

Bufou, e desejou do fundo de suas raízes que tudo pegasse fogo.